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Famílias órfãs choram por seus inocentes vitimas da violência

Aos 9 anos de idade, Brendo Alisson Coelho da Costa subiu pela primeira vez no ringue. Ele foi convidado pelo tio, Jura Oliveira, que foi boxeador profissional e treinador da seleção brasileira de boxe e fundou a Academia Rocky Balboa para ajudar a tirar

Aos 9 anos de idade, Brendo Alisson Coelho da Costa subiu pela primeira vez no ringue. Ele foi convidado pelo tio, Jura Oliveira, que foi boxeador profissional e treinador da seleção brasileira de boxe e fundou a Academia Rocky Balboa para ajudar a tirar crianças e adolescentes da vulnerabilidade social por meio do esporte. Desde cedo, Brendo se destacava nas lutas. Aos 17 anos, já era campeão panamericano. Agora, aos 20 anos, seu maior objetivo era representar o Brasil nas Olimpíadas de 2020. Mas, em alguns minutos, todo o sonho acabou. Ele foi mais uma das vítimas da onda de violência em Belém.

Jura Oliveira, tio do pugilista Brendo vítima da violência em Belém (Foto: Mauro Ângelo)

“Antes morrer lutando do que viver fugindo”. O quadro com esses dizeres fica estampado na parede da academia para servir de motivação, mas desde o último 1º de maio ganhou um tom de melancolia. Na data, Brendo tinha passado por um dia de treino intenso e, por volta de 21h, estava sentado na calçada, na rua 3 de Maio próximo a passagem Santa Lúcia, na Cremação, em frente à academia.

Sua esposa ao lado com a filha de seis meses no colo, seus amigos e seu irmão em volta, todos batendo papo antes de retornar às suas casas. Porém, dois motoqueiros apareceram e dispararam em direção às pernas de Brendo, para imobilizá-lo e, depois, executaram o pugilista. Em seguida, atiraram também contra seu irmão mais velho, Bruno, 22 anos, que ainda conseguiu fugir e foi socorrido, levado ao hospital, onde passou por cirurgia e está internado.

No dia seguinte, seu tio estava inconsolável. “O que mais nos deixa triste é que a gente faz tudo certinho, afasta-se do crime e foca em ter um futuro digno, mas não adianta e acaba sendo vítima da violência também”, lamenta. “E agora, qual providência que podemos tomar? Geralmente não acontece nada, ninguém é preso, não há Justiça. Só podemos orar para que o restante da família não passe por isso também”, declarou. Brendo, além de pugilista, era sargento da Marinha.

LUCAS

“Não vou saber como ele teria crescido” . Frase é de Rosiane, mãe de Lucas, 4 anos, que morreu vítima de bala perdida. (Foto: Ney Marcondes)

“Lucas era uma criança alegre, cheia de energia. Era muito difícil ver ele chorando, era sempre correndo, brincando, fazendo graça”, lembra Rosiana Nunes, mãe de Lucas Nunes Castro, 4 anos, que morreu em 21 de abril deste ano, vítima de bala perdida.

É mais uma das vítimas da violência da capital. O garoto queria ser atleta, como Brendo foi. Seu grande sonho era ser jogador de futebol. Apaixonado pela bola, ele adorava ir para a rua brincar com as outras crianças e um dos momentos prediletos era ver o pai jogar uma partida em um campo, na travessa Barão do Triunfo, esquina com a Senador Lemos, bairro da Sacramenta.

Em 20 de março, foi a última vez que pode compartilhar desse programa fraterno. Enquanto esperava iniciar o jogo, um motoqueiro apareceu na arena e começou a disparar, tendo como alvo um homem que estava por ali. As pessoas saíram correndo, com as crianças nos colos, inclusive Lucas. Após os disparos e depois de o criminoso ter fugido, perceberam que o menino estava sangrando. “Na hora bateu o desespero. Todo mundo correu para o hospital, mas ninguém imaginava que tinha sido tão grave”, recorda a mãe. No Pronto Socorro da 14, a desesperadora notícia já foi dada para a mãe: “seu filho não
vai sobreviver”.

Mesmo assim, ele foi transferido para o Hospital Metropolitano, onde passou por uma cirurgia. “Ele teve um bom pós-operatório e a gente realmente tinha esperança de que, no fim, ia dar tudo certo”, disse a mãe. A bala tinha atingido sua medula óssea. Lucas passou um mês internado. Conseguia reagir e passava o tempo assistindo a filmes de super-heróis. Apenas na última semana de vida que seu estado de saúde se agravou. Ele adquiriu fungo no sangue e começou um novo tratamento, mas não resisitiu e morreu.

Lucas (Foto: Arquivo Pessoal)

Sensação é de tristeza e injustiça

Hoje, só restam as memórias de um Lucas alegre, o caçula da família e querido por amigos e parentes. “Ele era nosso atleta e veio para ser uma luz na nossa vida. Não vou saber como ele teria crescido”, declarou a mãe.

Para Rosiane, a sensação é de tristeza e também de injustiça. Menos de 12 horas depois do baleamento, a Polícia Civil identificou o autor do crime. Mas, até ele está foragido. “Se eu não cobrar da polícia, sei que vai virar só estatística, só mais um. O governador e o secretário de Segurança não querem mostrar para o mundo como essa cidade está. Essa guerra que estamos vivendo não é só mais de polícia e ladrão. São crianças e jovens morrendo também nessa conta. Até quando?”, questionou Rosiane Nunes.

Em apenas 4 meses

- 02 de maio - Quatro adolescentes, entre 13 e 17 anos, foram assassinados no bairro do Curuçambá, em Ananindeua, vítimas de assassinos de um carro prata

- 01 de maio - O pugilista e sargento da Marinha Brendo Coelho, 20 anos, foi executado em frente da academia onde treinava, na Cremação. Seu irmão, Bruno, 22, também foi baleado e está internado.

- 29 de abril - Uma família inteira foi vítima de um atentado na passagem 24 de Dezembro, Terra Firme. A avó, Maria Izabel, e Diego Santana Dias, 13 anos, não resistiram aos ferimentos e morreram praticamente na hora. Diana Marques, 38 anos, Jonathan Dias, 22 anos, e Patrícia Dias, 23, também foram atingidos. Eles foram socorridos e estão internados no hospital. Diego, Patrícia e Jonathan são irmãos. Diana é filha de Maria.

- 20 de março - Lucas Nunes, 4 anos, foi atingido com uma bala na cabeça enquanto assistia a uma partida de futebol com o pai, em uma arena conhecida como “Arena do Marcão” na Barão do Triunfo, entre o canal da Pirajá e a Senador Lemos. Edem Cirino, 26 anos, foi identificado como autor dos disparos, mas está foragido até hoje. A criança morreu cerca de um mês depois.

- 13 de janeiro - Uma criança de oito anos foi baleada e morreu na Passagem das Flores, no bairro do Telégrafo, em Belém. Ela chegou a ser levada para o Pronto Socorro da 14 de Março, mas não resistiu aos ferimentos.

Emocional abalado pela insegurança

A vivência de um episódio de violência, como um assalto ou um sequestro, e até mesmo o enfrentamento de situações do tipo por alguém próximo podem desencadear, dependendo de características de cada pessoa, consequências psicológicas. Além do medo e da ansiedade, situações e condições específicas podem chegar a desencadear até mesmo transtornos, como o transtorno do estresse pós-traumático, por exemplo.

A psicóloga Flávia Vieira explica que, no caso do transtorno pós-traumático, a pessoa normalmente precisa ter vivenciado a situação para desencadear o quadro. “O transtorno de estresse pós-traumático é quando a pessoa vivencia diversos sintomas angustiantes por mais de um mês após o evento traumático”, explica, ao considerar que, nesses casos, o indivíduo pode se esquivar de falar sobre o que aconteceu. “Também pode acabar desencadeando sintomas de ansiedade mais intensa, de uma hipervigilância pensando no que pode acontecer de ruim”.

Nesses casos, as consequências podem ser tão significativas que começam a provocar prejuízo no funcionamento diário. A pessoa pode evitar sair, ir trabalhar e de ter qualquer contato com situações que possam representar possível ameaça de que algo ruim aconteça com ela. “Pode ser desencadeado por uma tragédia, por um assalto, por um sequestro, por acidentes... São várias as situações que podem favorecer com que a pessoa tenha um trauma e desenvolva um estresse após esse trauma”.

ANSIEDADE

A manutenção de pensamentos catastróficos recorrentes e do pessimismo são algumas das características da ansiedade generalizada, que também pode ser consequência do efeito que a violência pode causar a um indivíduo, dependendo da forma como ele próprio processa internamente essas experiências. “Tanto é que o transtorno de ansiedade é caracterizado pelo medo e ansiedade excessiva. E, nesse caso, a palavra ‘excessiva’ é muito importante. É quando a pessoa tem medo de tudo, de todos e tem pensamentos catastróficos o tempo todo, pessimismo”, explica a psicóloga.

Mesmo nos casos onde o indivíduo não vivenciou diretamente o episódio, ele pode sentir consequências emocionais em algum grau. “Tem pessoas que já ficam com medo porque alguém muito próximo viveu uma situação de violência, ou porque perdeu alguém muito próximo em um assalto, por exemplo. A situação não foi diretamente com ela, mas lhe envolveu de certa forma”, considera Flávia.

“Tudo vai depender da forma como a pessoa elabora tudo isso. Pessoas que vivenciam situações semelhantes podem desencadear sintomas ansiosos ou fobias específicas”.


(Alice Martins Morais e Cintia Magno/Diário do Pará)

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