plus

Edição do dia

Leia a edição completa grátis
Previsão do Tempo 26°
cotação atual R$


home
NOTÍCIAS PARÁ

A cada 20 minutos uma mulher é agredida em Belém

Lágrimas escorrem pelo rosto de V*., enquanto a jovem dona de casa vai contando os detalhes da história de amor que terminou sem final feliz. Mãe de um menino de 5 anos, ela está desempregada, triste e tem medo. V*. conheceu o hoje ex-marido há 6 anos. Fo

Lágrimas escorrem pelo rosto de V*., enquanto a jovem dona de casa vai contando os detalhes da história de amor que terminou sem final feliz. Mãe de um menino de 5 anos, ela está desempregada, triste e tem medo. V*. conheceu o hoje ex-marido há 6 anos. Foram apresentados por amigos em comum. Seis meses depois, ela engravidou. “O namoro era conturbado. Ele era muito ciumento, quando eu engravidei disse que não assumiria o filho”, conta a jovem.

Quando o menino nasceu, contudo, o rapaz mudou de ideia. Foram morar juntos e chegaram a oficializar a união, mas as brigas se tornavam mais constantes, até que, após 5 anos, V*. decidiu colocar um ponto final na relação, despertando a fúria do então marido. “Ele me chamou para conversarmos sobre a pensão do filho. Entrei no carro porque tudo parecia estar bem, mas lá ele tentou me violentar”, conta sem conter o choro. Véspera do Natal de 2015, a dona de casa M*., mãe de duas meninas, foi brutalmente espancada pelo marido.

No auge da briga, o homem tentou enforcá-la. A mulher foi salva pelas crianças, que começaram a gritar. M*. o denunciou, Ele pediu desculpas e tentou uma reconciliação, mas 4 meses depois, voltou a ameaçar a mulher e provocou um incêndio em casa. Com medo, M*. fugiu. Desde 15 de julho, mora com as filhas em um abrigo mantido pela Prefeitura de Belém. Na última quinta-feira, foi ouvida por um promotor, que deve encaminhar denúncia contra o agressor à Justiça, mas a angústia permanece. “Queria ter uma vida normal, com liberdade, mas não sei como vou sairdaqui”, lamenta.

REGISTROS

Relatos como esses têm sido cada vez mais comuns. Só nos primeiros 6 meses deste ano, foram 2.607 registros na Delegacia da Mulher, em Belém. Na capital, a média de 86 ocorrências a cada dia. Especialistas ouvidos pelo Diário foram unânimes em afirmar que o aumento de registros não necessariamente é sinal de que a violência esteja aumentando. Os números podem indicar que elas estão decididas a não aceitar as agressões.

E um fato importante foi decisivo para isso. Há exatos 10 anos, no dia 7 de agosto de 2006, era sancionada a Lei Maria da Penha (Lei 11.340) que agravou a pena para os casos de violência de gênero e exigiu que os Estados criassem estruturas para atender às mulheres. Antes da Maria da Penha, a pena mínima para casos de agressão era de um mês e o responsável podia ser condenado a prestar serviços à comunidade, pagar multa ou doar cestas básicas. Com a lei, a pena mínima foi para 3 meses de prisão. “Os casos acabavam indo para os juizado especial. Hoje eles recebem tratamento diferenciado”, explica a diretora da Delegacia da Mulher em Belém, Janice Brito.

Apesar das conquistas, o caminho para o combate à violência ainda é longo. No Pará, apenas 16 dos 144 municípios contam com delegacias especializadas. “A denúncia significa uma ruptura com os sonhos e o investimento afetivo que se fez na vida de uma mulher”, diz a psicóloga Josie Mota que costuma atender as mulheres vítimas de agressão. Segundo ela, há também o temor de que a denúncia acabe “não dando em nada” e só piore uma relação que, muitas vezes, envolve filhos.

“A violência doméstica é uma questão pública”

A deputada federal Elcione Barbalho está há quase 6 anos à frente da Procuradoria da Mulher. Criada em 2009 para, entre outras funções, contribuir com a fiscalização e acompanhamento da execução de programas do Governo Federal com impacto na questão de gênero, a Procuradoria tem sido uma das vozes ativas no Brasil em defesa da aplicação ampla da Lei Maria da Penha. Nesta entrevista ao DIÁRIO, Elcione, que está em seu 5º mandato na Câmara Federal, ressalta que a rede de proteção tem que continuar crescendo e se aprimorando.

P - A Lei Maria da Penha completa 10 anos de existência. A senhora poderia listar alguns avanços da lei?

R - Desde o ano passado temos observado um forte impacto positivo na redução de assassinatos de mulheres em decorrência de violência doméstica. A lei fez cair em cerca de 10% a taxa de homicídios domésticos, a partir de 2006, quando entrou em vigor. Esses dados foram apurados no estudo “Avaliando a Efetividade da Lei Maria da Penha”, feito pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

P: Quais as razões dessa redução?

R: A queda é atribuída, em primeiro lugar, ao fato de ter sido aumentada a pena para o agressor. Outros fatores que foram detectados pelo estudo do Ipea são: o maior empoderamento da mulher; a melhoria das condições de segurança para que a vítima denuncie; e o aperfeiçoamento do sistema de Justiça Criminal para atender de forma mais efetiva os casos de violência doméstica. Ou seja, em um cenário em que não existisse a lei, possivelmente as taxas de feminicídio aumentariam.

P: Esse resultado já pode ser considerado uma vitória?

R: Claro. Mas precisamos ficar atentos: a violência ainda não parou. Nós que lutamos para combatê-la é que ganhamos um forte aliado há 10 anos, com a promulgação da Lei Maria da Penha. Um levantamento feito pelo Instituto Patrícia Galvão, mostra que a Lei Maria da Penha é reconhecida por 98% da população brasileira. Além disso, foi considerada pela ONU uma das 3 melhores legislações do mundo no combate à violência contra a mulher e vem trazendo mudanças culturais importantes.

P: Que mudanças seriam essas?

R: Hoje a população tem muito mais consciência de que a questão da violência doméstica não é mais privada, do homem e da mulher. É uma questão pública, em que a mulher tem direitos e o agressor deve ser punido. Antes da Lei Maria da Penha, os casos de violência doméstica eram tratados como crimes de menor poder ofensivo, que poderiam ser punidos apenas com a distribuição de cestas básicas ou multas. Hoje dá cadeia. Então sim, sob este aspecto consideramos uma grande vitória. Mas ainda temos que avançar muito.

P: E o que falta para que ela seja aperfeiçoada?

R: Uma das maiores barreiras das mulheres em situação de violência doméstica é justamente o tratamento humilhante e machista que recebem nas delegacias. As mulheres acabam sofrendo um segundo abuso, muitas das vezes em que procuram apoio policial. Exemplo típico recente foi o caso daquela menor estuprada e violentada no Rio de Janeiro. Ela teve seu depoimento questionado, menosprezado, além de ter sido quase culpabilizada pela violência que sofreu. Isso ocorre com muito mais frequência do podemos imaginar.

P: Como avançar nesse atendimento?

R: Sem o orçamento necessário que permita que novas Delegacias da Mulher sejam criadas, que passem a funcionar 24 horas por dia, em que o atendimento seja realizado prioritariamente por mulheres e que os funcionários tenham uma formação adequada para esse tipo de atendimento, é impossível avançar na busca da redução da violência contra a mulher. Não há previsão orçamentária e essa tem sido uma das nossas constantes batalhas no Congresso Nacional.

(Rita Soares/Diário do Pará)

VEM SEGUIR OS CANAIS DO DOL!

Seja sempre o primeiro a ficar bem informado, entre no nosso canal de notícias no WhatsApp e Telegram. Para mais informações sobre os canais do WhatsApp e seguir outros canais do DOL. Acesse: dol.com.br/n/828815.

Quer receber mais notícias como essa?

Cadastre seu email e comece o dia com as notícias selecionadas pelo nosso editor

Conteúdo Relacionado

0 Comentário(s)

plus

Mais em Notícias Pará

Leia mais notícias de Notícias Pará. Clique aqui!

Últimas Notícias