A Assembleia Legislativa do Estado do Pará (Alepa) recebeu
nesta terça (24), o segundo pedido de impeachment do procurador-geral de
Justiça, Gilberto Valente Martins. De autoria do advogado André Cavalcante, a
solicitação tem como justificativa a acusação de que o chefe do Ministério
Público do Estado do Pará (MP-PA) cometeu crimes de improbidade administrativa,
abuso de autoridade e prevaricação no intento de forjar provas que
contribuíssem para a condenação de uma desembargadora do Tribunal de Justiça do
Estado (TJ-PA), e que mantê-lo no cargo depois disso coloca em xeque a própria
credibilidade do órgão, de natureza fiscalizadora do Poder Público. A situação
é alvo do processo judicial 0008300-18.2018.8.14.0401, que constatou a atuação
irregular do PGJ, e foi revelada com exclusividade pelo DIÁRIO na edição do
último dia 18 de novembro.
Em sua decisão, o desembargador Leonam Cruz afirma que “O
procedimento investigativo da escuta ambiental ocorreu à margem das leis
regentes e entendo que houve ilegalidade e violação ao princípio do Juiz
Natural”, e ainda que “uma ação naturalmente esperada não tem ilegalidade, mas
preparada, como foi, não é legítima. Não foi uma ação controlada e sim
construída e porque não dizer, forjada”. E é ainda mais enfático: “Não se
discute que a escuta foi preparada para pegar em flagrante o apelado Paulo
David, embora sem êxito. No entanto, atos assim, viciados, não constituem
procedimento válido como meio de prova, pois foi nada mais, nada menos, que uma
ação fabricada e não esperada”.
De acordo com o item XXXIV do artigo 92 da Constituição
Estadual, a Alepa tem competência de julgamento nos crimes de responsabilidade,
e pode processar e julgar o procurador geral de Justiça e o procurador geral do
Estado. André analisa que, ao longo dos últimos anos, o que se tem visto é o
país passar por um processo de desconstituição de instituições que são a base
do estado democrático de direito - não poupando nem o Supremo Tribunal Federal
(STF), constantemente atacado quando expede decisões contrárias aos interesses
de determinados grupos. Portanto agora, mais que nunca, é preciso que as
instituições mais do que corretas, probas, transparentes, zelem pelo seu pilar
principal de sustentação, que é a legalidade.
“Essa percepção é ainda mais latente em se tratando do Ministério Público, tido pelo art. 127 da Constituição Federal como essencial à promoção da Justiça, pois é o fiscal da correta aplicação da lei e, assim, o defensor da sociedade. Não se pode admitir que paire a menor sombra de dúvida quanto sua lisura e probidade, inclusive sobre sua maior autoridade”, justifica, reforçando que o pedido preza pela “defesa de uma instituição essencial à Justiça e a toda sociedade paraense”.
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Segundo pedido de impeachment de Gilberto Valente é protocolado na Alepa
Advogado explica porque pediu impeachment do procurador geral de Justiça
Citando o processo aberto para investigar a conduta de
Valente no julgamento da desembargadora aposentada Marneide Trindade Pereira
Merabet e seu filho, o advogado Paulo David Pereira Merabet, ambos inocentados
pela 3ª Turma de Direito Penal do Tribunal no dia 12 deste mês, André explica
estar comprovado que o atual procurador-geral de Justiça, à época da
ocorrência, em 2011, integrante o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), agiu
movido por interesses pessoais. A absolvição dos investigados se deu pelo
reconhecimento das ilegalidades cometidas por Gilberto no curso das
investigações, o que levou à anulação do processo desde a denúncia.
“Ele articulou uma verdadeira emboscada com o intuito de
obter provas notoriamente ilegais, já que usou equipamento de gravação e escuta
eletrônica do MP-PA que somente pode ser usada com autorização judicial, por
força da Lei nº 9.296/1996 e Resoluções do Conselho Nacional do Ministério
Público (CNMP)”, detalha o advogado. “Se um membro da alta cúpula do Ministério
Público que, o mais grave, a época dos fatos, era Conselheiro do Conselho
Nacional de Justiça, não apresentou o mínimo escrúpulo para agir à margem da
lei contra uma desembargadora ao plantar uma escuta ilegal, que garantia há que
o mesmo procedimento não foi utilizado contra qualquer do povo? Os fatos são
gravíssimos e suas repercussões não podem pesar sobre a instituição, essa é a
base do nosso pedido”, explica André Cavalcante.
A ACUSAÇÃO
De acordo com a defesa dos acusados, em 2011, Gilberto
investigou a desembargadora e seu filho com auxílio de uma advogada equipada
com aparelhos de inteligência do antigo Grupo Especial de Prevenção e Repressão
às Organizações Criminosas (Geproc), atual Grupo de Atuação Especial no Combate
ao Crime Organizado (Gaeco), de servidores do Ministério Público e da Polícia
Militar, sem ter feito qualquer comunicação ao Superior Tribunal de Justiça
(STJ) ou ao TJ-PA para realizar investigação criminal contra um integrante do
colegiado, como manda a lei.
Segundo os autos, em dezembro daquele ano, a advogada Maysa
Corrêa teria ido ao gabinete da então desembargadora Marneide Merabet para
tratar de um processo. A advogada relatou que a magistrada teria dito para ela
procurar o seu filho Paulo David para resolver o problema. A advogada então
teria saído do gabinete e ido ao encontro de uma juíza, sua prima, informando
tal fato. A juíza entrou em contato com o então promotor e conselheiro do CNJ,
Gilberto Valente Martins, informando a situação. O promotor, que estava em
Portugal, falou com a advogada e pediu ao um colega integrante do Geproc que
fornecesse todo o aparato tecnológico e logístico de gravação, além de pessoal,
viatura e um policial militar, para dar apoio à advogada para que pudesse
gravar uma conversa dela com o filho da desembargadora.
O antigo Geproc só forneceu as escutas telefônicas para as
advogadas porque o atual Procurador Geral do MP-PA lhes disse que era uma
investigação que estava sendo conduzida por ele no CNJ, o que não ficou
comprovado. A advogada foi ao encontro do filho da desembargadora com o
equipamento de gravação, insinuando que tinha interesse em “comprar” uma
decisão da magistrada, num caso que sequer a advogada Maysa atuava e sem que
Paulo Merabet soubesse do que se tratava. Durante todo o tempo, o filho da
desembargadora foi provocado a praticar um crime de corrupção que nunca
existiu, segundo consta na decisão judicial. O Tribunal de Justiça, ao julgar o
recurso da desembargadora e de seu filho para absolvê-los da acusação,
considerou ter sido provado que Maysa Corrêa sequer estava habilitada no
processo, que não foi ao gabinete da magistrada e que foi criada uma cena
idealizada pelo então promotor de justiça e então conselheiro do CNJ Gilberto
Martins para tentar incriminar a desembargadora e seu filho.
Trechos da sentença
do desembargador Leonam Gondim
Observo com clareza que, desde a notitia criminis, o
procedimento investigativo da escuta ambiental ocorreu à margem das leis
regentes e entendo que houve ilegalidade e violação ao princípio do juiz
natural”
Outro fato relevante é que a vítima declarou que foi
orientada pelo representante Ministerial a atrair o corréu. Dando a impressão
de uma espécie de emboscada...”
... Uma ação naturalmente esperada não tem ilegalidade, mas
preparada, como foi, não é legítima. Não foi uma ação controlada e sim
construída e porque não dizer, forjada. ”
Não se discute que a escuta foi preparada para pegar em
flagrante o apelado Paulo David, embora sem êxito. No entanto, atos assim,
viciados, não constituem procedimento válido como meio de prova, pois foi nada
mais, nada menos, que uma ação fabricada e não esperada”.
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