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Consciência Negra: pelo direito de viver na própria comunidade

Voltada para a exuberante natureza nativa, a forma de organização das construções que compõem a Comunidade Quilombola Caeté, no município de Abaetetuba, lembra o formato de uma aldeia. No centro, ao fundo, a bela igreja centenária dá início ao enfileir

Imagem ilustrativa da notícia Consciência Negra: pelo direito de viver na própria
comunidade camera Integrantes do quilombo mantêm raízes fincadas na história | Ney Marcondes/Diário do Pará

Voltada para a exuberante natureza nativa, a forma de organização das construções que compõem a Comunidade Quilombola Caeté, no município de Abaetetuba, lembra o formato de uma aldeia. No centro, ao fundo, a bela igreja centenária dá início ao enfileiramento de casas e construções que seguem, uma ao lado da outra, formando uma espécie de semicírculo que termina por abraçar o leito do igarapé que já chegou a ser a única forma de acesso à vila. Mantida desta forma até hoje, a organização do espaço não ocorre por acaso. É apenas um dos resquícios da cultura viva deixada pelos fundadores do local marcado pela resistência.

Criado na comunidade e habitante até hoje, o professor e militar Eder Nascimento, 35 anos, destaca que, segundo as histórias contadas pelos moradores mais antigos, a formação do Caeté se deu a partir da revolução Cabana – uma das maiores revoluções sociais já registradas no Brasil, ocorrida no Pará, no século XIX.

Como fruto da resistência e organização popular, centenas de negros escravizados fugiram das casas de engenho que existiam na região à época, para se afugentar em áreas como a do Caeté. “Eles buscavam se refugiar com os indígenas que já habitavam essas áreas e daí surgia essa parceria entre o negro e o indígena e a miscigenação entre esses dois grupos”, conta Eder. “Desde então a gente vem vivendo muitas das tradições desses nossos antepassados, como esse formato de aldeamento circular que a nossa comunidade mantém até hoje”.

Habitada, hoje, por cerca de 125 famílias, o local teve a origem reconhecida oficialmente em 2018, quando recebeu a titulação coletiva da terra enquanto área remanescente de quilombo. Para que isso ocorresse, porém, Eder conta que foi necessário enfrentar mais de uma década de luta. Dentre os desafios, explicar aos moradores a importância de se pensar no coletivo. “A necessidade era a de conscientizar as pessoas que viviam nessa área a abrir mão do título individual da terra, em prol do coletivo”, lembra Eder, ao considerar que, hoje, a comunidade inteira é protegida pela sua importância histórica e cultural de resistência. “Essa área foi um refúgio para a população escravizada, onde eles tinham um sonho de liberdade e até hoje o nosso forte é voltado para o bem comum de todos”.

Fazendo jus ao modo de vida defendido por seus antepassados, até hoje a comunidade mantém muitas das práticas e formas de organização adotadas há mais de cem anos. A principal atividade econômica do Caeté continua sendo o cultivo da mandioca para a produção de farinha e, além dela, os moradores também herdaram de seus antepassados o hábito de atuar sempre em coletivo para garantir as melhorias que necessitam. “Nós temos um mutirão comunitário que acontece desde os primórdios com os nossos antepassados”, lembra o agricultor Valdir Júnior Santos, 47 anos, nascido e criado no Caeté. “Nós mesmos nos reunimos para cuidar da vila, limpar, construir uma casa para alguém que esteja precisando... tudo é feito coletivamente”, complementa o presidente da Associação da Comunidade Remanescente de Quilombo do Caeté (Aquicaeté), Thiago Mofort.

Esse protagonismo exercido pelo coletivo, além do contato direto com a natureza, foi o que levou a professora Eleci Ramos Chaves, de 34 anos, a fazer questão de fixar de vez moradia na comunidade. Assim como seus bisavôs, avôs e pais, Eleci nasceu e foi criada no Caeté. Durante os 34 anos de vida, apenas três foram passados longe da comunidade.

“Quando eu tinha onze anos começaram a surgir aquelas ideias de as meninas irem para Belém para trabalhar nas casas das famílias com a falsa promessa de que lá poderiam estudar”, lembra. “Com 11 anos eu fui nessa ‘barca’, mas eu não me acostumei. Na realidade os nossos pais eram enganados porque a gente só trabalhava. Foi então que, com 14 anos, eu voltei para o Caeté fugida, fugida igual aos meus antepassados”.

Diferente da promessa ouvida, foi no retorno à sua terra e à comunidade que Eleci teve maiores oportunidades. Na cidade, ela conseguiu estudar apenas até o 5º ano. Já de volta ao Caeté, a jovem não apenas concluiu o ensino básico, como garantiu a graduação em licenciatura em letras pela Universidade Federal do Pará (UFPA), campus de Abaetetuba. Hoje, ela e o esposo, o agricultor Leonardo Martins Chaves, 38, têm no cultivo da mandioca a principal fonte de renda.

Para Eleci, o retorno à comunidade, onde também moram os seus seis irmãos, e o acesso à educação contribuíram, inclusive, com o processo de conscientização sobre sua própria identidade. “A sociedade ainda associa o que é preto a tudo que não presta. Então eu acredito que o fato de eu ter tido acesso à educação também me ajudou a ir desconstruindo essa imagem que a sociedade faz sobre o negro”, avalia. “O preconceito ainda é muito enraizado, então a necessidade de resistência continua sendo diária”.

Consciência data

A data foi instituída pela Lei nº 12.519/2011 e faz referência à morte de Zumbi, líder do Quilombo dos Palmares, morto em combate ao lutar contra a escravidão no período colonial brasileiro.

QUILOMBOS

No período da escravidão, os negros escravizados que conseguiam fugir se refugiavam em locais escondidos no meio das matas, onde conseguiam viver de acordo com a cultura africana, plantando e produzindo em comunidade. Tais locais eram chamados de quilombos.

Fonte: Só História.

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