À medida que crescem a adoção e a importância da chamada
Internet das Coisas, o tema também desperta interesse e chama a atenção de
autoridades públicas, de governos a agências reguladoras, passando pelo
Parlamento.
Após o anúncio do Plano Nacional de Internet das Coisas pelo
governo federal, a Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel) está com
consulta pública aberta para ouvir a sociedade sobre quais regras devem incidir
sobre esse sistema de tecnologias.
O termo Internet das Coisas (IdC, ou IoT na sigla em inglês)
vem sendo adotado nos últimos anos para designar um ecossistema em que não
apenas pessoas estão conectadas por meios de seus computadores e smartphones,
mas também dispositivos estão interligados entre si, com usuários e com
sistemas complexos de coleta, processamento de dados e aplicações de diversos
tipos. Saiba mais.
Segundo o gerente de programas para software e soluções na
nuvem para América Latina da consultoria global IDC, Pietro Dalai, o Brasil
ainda está bem atrás de outras nações, embora numa posição boa na região,
consolidando-se como o mercado mais expressivo. A IDC estima que o volume de
recursos movimentado pelo ecossistema, considerando todas as fases da cadeia de
valor, deve chegar neste ano a R$ 38 bilhões.
“O plano nacional de Internet das Coisas da China foi
publicado 7 ou 8 anos atrás. O nosso estamos publicando agora. Mas em termos de
implementação na América Latina a gente está bem. Temos uma infraestrutura de
Tecnologia da Informação no país que já tem condições de suportar projetos de
Internet das Coisas”, avalia o gerente da consultoria IDC.
Regulação
Parte importante das regras deste novo segmento será
definida na consulta pública da Anatel, aberta no início de agosto. A sondagem
visa “diminuir barreiras à expansão das aplicações baseadas em internet das
coisas e em comunicação máquina a máquina”. Os interessados podem fazer
contribuições por meio do site da Anatel até o dia 17 de setembro.
De acordo com o documento de explicação da consulta, um dos
seus intuitos é avaliar se os modelos de negócio relacionados à IdC “podem ser
abarcados na regulamentação atual” e como poderiam ser enquadrados do ponto de
vista das regras vigentes. O debate inclui a reflexão se os serviços existentes
- em geral previstos para a relação entre pessoas e máquinas - seriam adequados
para comunicações entre equipamentos.
Entre as normas existentes atualmente, há aspectos acerca de
exigência mínima de qualidade do serviço, obrigações relacionadas aos direitos
do consumidor e formas de prestação do serviço. A Anatel quer saber se há
necessidade de flexibilizar esses dispositivos, e de que forma. Entre os
requisitos legais em avaliação na consulta, entram também as taxas e os
tributos incidentes sobre o setor. Atualmente, a Anatel cobra um valor por
aparelho. A consulta problematiza se este é o melhor modelo, dado o fato de que
os equipamentos são menores do que smartphones ou computadores.
“Surge a incerteza se seria plausível manter o valor atual
fixado para a TFI [Taxa de Fiscalização de Instalação] e TFF [Taxa de
Fiscalização de Funcionamento] decorrentes de licenciamento das estações e se
tais valores poderiam ser um empecilho”, pondera o documento da consulta. O
texto também cogita estabelecer condições diferenciadas a depender do serviço e
da empresa prestando.
Plano Nacional
As regras específicas em debate na Anatel estão relacionadas
a diretrizes mais gerais definidas no Plano Nacional de Internet das Coisas
(Decreto nº 9854 de 2019), anunciado em junho deste ano. Os resultados a serem
perseguidos a capacitação profissional relacionada a essas tecnologias, a
promoção da competitividade e da produtividade em empresas atuando no
desenvolvimento de produtos e serviços de IdC e o fomento de uma maior inserção
internacional do Brasil em relação a este tema.
Caberá ao Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e
Comunicações (MCTIC) decidir as áreas prioritárias que receberão mais atenção e
incentivos. Mas o decreto já elenca algumas: saúde, cidades, indústrias e
atividades rurais. A seleção dessas áreas será realizada a partir de critérios
de “oferta, demanda e capacidade de desenvolvimento local”. O Plano Nacional de
IdC prevê a criação de projetos de fomento à implantação dessas inovações, como
a criação de centros de competência para tecnologias inovadoras em IdC e um
observatório nacional com foco no monitoramento do progresso da transformação
digital no país, incluindo as políticas públicas voltadas a esse processo.
De acordo com o secretário de empreendedorismo e inovação do
MCTIC, Paulo Alvim, já há duas câmaras funcionando para pensar ações
específicas em dois temas: indústria e agricultura. Ele destaca que um dos
grandes desafios é a qualificação da força de trabalho, uma vez que a adoção
dessas tecnologias implica novos conhecimentos.
“Estamos mobilizando redes do Ministério da Educação e
Sistema S [Sebrae, Sesc, Senac, Senai, Sesi...] no sentido de prontamente
oferecer formação porque são empregos do futuro. Já tem um curso do Senai
gratuito sobre o tema. Esta questão se tornou estratégica e estamos falando de
setor que tem vagas mas não tem gente qualificada para ocupá-las. Temos que
acelerar isso”, ressalta o secretário.
Na opinião do advogado especialista em direito digital e
autor de livro Internet das Coisas, Eduardo Magrani, o plano tem um foco maior
na dimensão comercial do tema, não tocando em aspectos importantes relacionados
aos impactos desses novos dispositivos na sociedade, como a garantia de
direitos e os riscos do ponto de vista ético. Segundo ele, o direito não está
preparado ainda para o ambiente da IdC, cujas aplicações são feitas a partir de
algoritmos e soluções baseadas em inteligência artificial.
“O plano de IdC não
olha para essa nova era das coisas inteligentes, que agem retirando a autonomia
do cidadão neste mundo hiperconectado. Problemas sérios de cibersegurança onde
nem os fabricantes têm preocupação com segurança ou privacidade. Precisamos de
barreiras mais fortes para que os padrões sejam altos. Neste universo, é
importante garantir valores humanos na fase do design tecnológico, garantindo
valores como privacidade e ética”, defende o advogado.
No Congresso Nacional
O tema da IdC também passou a ser objeto de iniciativas no
Parlamento. O Projeto de Lei No 7657 de 2019, de Vitor Lippi (PSDB-SP), propõe
zerar taxas de “estações móveis de serviços de telecomunicações que integram
sistemas de comunicação máquina a máquina”, termo técnico para designar
equipamentos relacionados ao ecossistema de IdC.
Em maio deste ano, a Comissão de Tributação e Finanças da Câmara dos Deputados aprovou relatório do deputado Eduardo Cury (PSDB-SP), que reforça a isenção da Taxa de Fiscalização de Instalação (TFI) e da Taxa de Fiscalização de Funcionamento (TFF), bem como as contribuições para o fomento da radiodifusão pública e desenvolvimento da indústria cinematográfica. Além disso, a redação desobriga a necessidade de licenciamento prévio.
Até o momento da publicação desta reportagem, a matéria
estava em análise pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara dos
Deputados. Como tramita em caráter terminativo, se for aprovada nesta comissão,
deve ser encaminhada ao Senado Federal para apara ser apreciada pelos
parlamentares.
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