Dois caminhos: música e poesia

Já por mais de vinte anos, Henry Burnett e Renato Torres estão ligados por dois dos laços mais poderosos da existência: a música e a palavra. Em torno destas, a amizade e o companheirismo; shows; gravações; parcerias. De certa forma estas duas décadas se concentram no espetáculo “Dois Caminhos”, que ambos apresentam hoje à noite na Casa do Fauno.

Ainda adolescente, na década de 80, Henry começava a compor e, não necessariamente à margem da música paraense “regional”, explorava um filão pop com abordagens filosóficas. Poucos anos depois, a década de 1990 foi marcada em Belém por uma explosão de criatividade e rebeldia que se concentrava no bar Go Fish e na voz de Sônia Nascimento, da banda Aborto Elétrico. Renato Torres era o guitarrista e um dos arranjadores do grupo.

A trajetória dos dois (individualmente, juntos e com outros parceiros) tornou-os nomes fundamentais na cena paraense. Henry lançou vários discos, DVD, livros de filosofia e sobre a cultura brasileira; Renato lançou discos, o livro de poemas “Perifeérico”, participou de espetáculos cênicos; compôs, fez arranjos e shows com quase todos os grandes nomes da atual música do Pará.

Ao longo destes anos em que estiveram, quase sempre, ligados de forma direta, Henry e Renato compuseram músicas marcantes, como “Reino” (“se eu falo/você diz: cala/e cruza as pernas/no meio da sala”); e “Samba sobre nada” (“melhor evitar a prece/se a bênção te merece/surgirá em teu silêncio”). Já em 2006, gravaram algumas delas no formato voz e violão. E agora, permitidos pela tecnologia, como lembra Renato, concluíram estes registros com as novas composições e vão mostrar o resultado no show de hoje.

As músicas resumem, de fato, aquelas características fundamentais dos dois, música e palavra. Intensas e sóbrias, as melodias se enriquecem com as interferências mágicas da guitarra de Renato. Os dois se alternam nos vocais, combinam siameses guitarra e violão e promovem consistentemente o encontro lítero-musical tão inerente à música brasileira: “Nem sei se vale a pena/Viajar no tempo, à toa me buscar” (“Dois Caminhos”, de Henry Burnett); “Vejo que vale o esforço/Vejo que forço o esboço/A se tornar um eu mesmo.//Continuo a esmo comigo/Tentando caminhos diversos/Os ermos são todos amigos/Os ermos e os plenos perigos/Do escuro tempo de dentro” (“Esboço”, Henry/Renato).

“Dois Caminhos” envolve outros artistas: “Pedra sobre o mar, árvore na voz/O meu cantar quer saber de nós/Quer abraçar o que o tempo traz” (“O Caminho, Daiane Gasparetto/Renato Torres); e “Flor madeira no vaso de barro/Pintado de azul/Da minha janela a rosa amarela/O cravo e o lírio plantei no jardim” (“Flor madeira”, Henry/Renato/Ronaldo Silva).

Para além de afinidades e entrosamento, shows e gravações minimalistas (em processo de finalização no Guamundo Home Studio, de Renato), o que “Dois Caminhos”, enfim, nos proporciona é a alta emoção da arte elaborada com enlevo, pensamento, conhecimento, e a certeza de que “O caminho é filho/De cada passo que a gente dá”. E assim, hoje os caminhos de todos nós se encontram na Casa do Fauno.

Show Dois Caminhos: Renato Torres e Henry Burnett

Quando? Nesta quinta-feira (14), 21h

Onde? Casa do Fauno (Aristides Lobo, entre Benjamin e Rui Barbosa)

(Edson Coelho de Oliveira, escritor)