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Veja histórias de pessoas que não tem acesso a lazer e serviços básicos no Pará

Da porta da casa de madeira construída na avenida Perimetral, em Belém, a aposentada Adelaide Conceição Rodrigues, 75 anos, vê os estudantes que passam nos ônibus ou em carros particulares em direção à Universidade Federal do Pará (UFPA). Morando no perím

Da porta da casa de madeira construída na avenida Perimetral, em Belém, a aposentada Adelaide Conceição Rodrigues, 75 anos, vê os estudantes que passam nos ônibus ou em carros particulares em direção à Universidade Federal do Pará (UFPA). Morando no perímetro entre o segundo e o terceiro portões do campus universitário do Guamá, apenas alguns metros distanciam a idosa da entrada da instituição que é referência em produção de conhecimento na Amazônia. Apesar disso, ela mesma convive com a realidade de nunca na vida ter sentado em uma carteira de escola para estudar.

“Eu comecei a trabalhar muito cedo para sustentar meus irmãos”, lembra, ao revelar que este ‘muito cedo’ iniciou quando ela era apenas uma criança de oito anos. Adelaide conta que, há cerca de 70 anos, ela não teve a oportunidade de ir à escola primária, muito menos de chegar até o ensino superior. Das instalações da universidade, ela conhece apenas o igarapé em que, logo que se mudou para o bairro, tomava banho e lavava roupas. “Antes isso aqui era tudo mato, mas já existia a universidade”.

Da lida iniciada ainda na infância, Adelaide conseguiu não apenas sustentar os sete irmãos, como criar as suas duas filhas. As crianças de Adelaide, diferente dela, puderam concluir o ensino básico. As filhas não chegaram, até hoje, a cursar uma faculdade, mas a matriarca da família sonha com um futuro diferente para os netos e tataranetos que já nasceram. “Eu nunca fui para a escola porque trabalhei muito, mas eles podem ter essa chance”, considera. “Em nome de Jesus eles vão chegar lá e se for para a universidade (a UFPA) vai ser um grande orgulho na minha vida”.

CONTRASTES

Contrastes como o vivenciado diariamente por Adelaide se espalham pelos bairros de Belém, bastando um olhar mais atento para perceber. Na Pratinha, a diarista Elenilde Rodrigues, 36 anos, convive há 21 com o barulho dos aviões que sobrevoam a sua casa frequentemente. Ainda que more na rua que passa atrás de uma das pistas do aeroporto internacional de Belém, a passagem Samaúma, Elenilde e suas duas filhas, de 11 e 14 anos, nunca viajaram de avião. “Eu nunca tive a oportunidade”, conta.

"Em nome de Jesus eles vão chegar lá e se for para a universidade (a UFPA) vai ser um grande orgulho na minha vida”, diz a aposentada Adelaide Conceição Rodrigues, de 75 anos. (Foto: Ricardo Amanajás/Diário do Pará)

Natural do Estado do Maranhão, Elenilde chegou a Belém, de ônibus, com 15 anos. Já naquela época, uma das coisas que mais lhe encantou na cidade – depois da energia elétrica – foram os voos dos aviões que passavam sobre a casa onde ela foi morar. Diante do primeiro sinal de aeronave, ela saía correndo de dentro de casa para avistar o veículo cortando o céu. “Na época tudo aqui era mato. Depois que colocaram esse muro que protege das pessoas passarem pra área do aeroporto”.

Com o passar dos anos, a moradora aprendeu a diferenciar os aviões de cada companhia pela cor. Ela também gosta de observar o momento exato em que as rodas dos veículos se recolhem, logo após a decolagem. “Agora os aviões estão vindo muito coloridos. Tem um que é todo laranja, um deles é todo verde. Estão muito mais bonitos”. Ainda que a possibilidade de voar tão alto cause certo frio na barriga, Elenilde não titubeia ao anunciar um local que ela enfrentaria o nervosismo da viagem para poder conhecer. “Acho que a Disney é um sonho de todo mundo. Eu tenho o sonho de ir com as minhas filhas, mas a passagem ainda é muito cara, principalmente para as pessoas que são mais humildes”, diz. “Por enquanto eu só observo os aviões”.

Sem oportunidades de frequentar espaços de lazer

A condição de observador também é exercitada diariamente pelo autônomo Oscar Carvalho, 63 anos. Há cerca de 30 anos ele e a esposa mantêm uma banca de venda de bombons ao lado do Cinema Olympia. A observação, porém, não se destina aos filmes exibidos na telona, mas sim ao movimento de espectadores que entram e saem da sala de exibição. “Muita gente vem e compra um bombom, para aqui um instante antes de entrar para ver o filme”.

"Se eu parar um dia para ir ver um filme, é um dia que eu deixo de ter renda. Na hora do filme é justamente quando dá mais gente”, diz o vendedor de bombons, Oscar Carvalho. (Foto: Ricardo Amanajás/Diário do Pará)

Apesar da proximidade física, a última vez que Oscar entrou em um cinema para assistir a um filme foi há cerca de 40 anos, quando ele acompanhou as aventuras narradas no longa ‘Tubarão’. A ausência não necessariamente está relacionada ao preço do ingresso em si – no Olympia, por exemplo, a entrada é gratuita -, mas às condições de vida que não permitem espaço para o lazer.

“Eu não tenho tempo. Se eu parar um dia para ir ver um filme, é um dia que eu deixo de ter renda. Na hora do filme é justamente quando dá mais gente”, considera, ao lembrar que criou os dois filhos com a renda da venda de bombons. “Eu adoro cinema. Se eu pudesse, queria ver ‘baleia assassina’ (Orca - a baleia assassina, filme de 1977)”.

Em outro ponto turístico da capital paraense, a Estação das Docas, a distância que separa o artesão Ricardo Ferreira, 37 anos, das dependências do centro de lazer e turismo se restringe a alguns passos. Quando se está dentro do local, porém, a distância percebida é maior ainda. Um afastamento construído pela desigualdade percebida não apenas nos preços inacessíveis para muitos, mas, no caso dele, também nos olhares. “Por mais que seja um espaço público, a divisão social e de classe fica muito clara ali”, conta, ao lembrar que já chegou a visitar o ponto turístico, mas que não costuma frequentá-lo.

TRABALHO

Desde que saiu da casa dos pais, localizada no município de Franca (SP), Ricardo sobrevive do trabalho de produção e venda de bijuterias, produtos que ele mesmo oferece aos possíveis clientes nas ruas de diferentes cidades brasileiras. Ao longo de 15 anos, o artesão já passou por 18 estados e, na capital do Pará, segue há três meses.

Na tentativa de atrair os turistas que passam pelo local, ele escolheu como ponto temporário a calçada da Estação das Docas, mas conta que ele mesmo nunca entrou para fazer uma refeição ou tomar uma cerveja no local. “Eu normalmente almoço no Ver-o-Peso ou no ‘popular’”, afirma. “Não dá para ficar almoçando na Estação porque uma única refeição custa um dia inteiro de trabalho”, diz.

Desigualdade

- Em 2017, a Região Norte apresentou a segunda maior desigualdade de renda do país, de acordo com levantamento divulgado na última semana pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).

- Na Região, os 10% mais ricos da população ganhavam 18,4 vezes a mais do que os 40% mais pobres.

- Já no Estado do Pará, os 10% mais ricos da população ganhavam, em média, R$3.400 a mais do que os 40% mais pobres.

- Dentre as capitais, Belém teve a segunda maior desigualdade de renda da Região Norte, perdendo apenas para Manaus. Na capital paraense os 10% mais ricos ganhavam cerca de R$7.400 a mais do que os 40% mais pobres. Já em Manaus a diferença chegou a R$8.600.

Fonte: IBGE.

(Cintia Magno/Diário do Pará)

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