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Cotijuba: da educação à tortura, uma história esquecida

Antes de qualquer praia, a vista que se impõe a frente de quem sobe o trapiche de Cotijuba é a das ruínas de parte da história do Pará. Emoldurada pelo céu azul da ilha que integra o município de Belém, a fachada do educandário Nogueira de Farias – que de

Antes de qualquer praia, a vista que se impõe a frente de quem sobe o trapiche de Cotijuba é a das ruínas de parte da história do Pará. Emoldurada pelo céu azul da ilha que integra o município de Belém, a fachada do educandário Nogueira de Farias – que depois veio a ser utilizado como presídio – impõe a lembrança de um passado obscuro da memória do Estado e que, por isso mesmo, não pode ser esquecido.

Com o antigo presídio já desativado e em ruínas, a saída das charretes e do bondinho que levam os turistas às praias se concentra na frente do monumento histórico. Até o início deste ano, os veículos seguiam pela rua Magalhães Barata, principal da ilha. Desde julho, porém, o percurso percorrido pelo bondinho puxado por um trator, acende um alerta para a necessidade de preservação do monumento histórico. Para não estragar os paralelepípedos instalados na rua principal, o veículo é obrigado, agora, a transitar por dentro das ruínas do educandário/presídio.

Charreteiro em Cotijuba há três anos, Miguel Guilherme de Almeida Filho, 27 anos, conta que as mudanças iniciaram a partir da obra de pavimentação. Com o argumento de facilitar a mobilidade dos moradores na ilha, a Prefeitura Municipal de Belém (PMB) realizou a cobertura de um trecho de 1 km da rua com bloquetes de concreto. A obra teria sido concluída em julho deste ano e, a partir de então, o tradicional bondinho teria sido impedido de circular pela via. “Impediram o bondinho de circular por lá porque o trator é pesado e poderia danificar a rua”, lembra Miguel.

Como solução, um caminho foi ‘aberto’ na área que abriga as ruínas. Lotado de passageiros, o bonde agora passa entre as construções que compõem o antigo presídio. “Tiveram até que tirar algumas árvores que ficavam no caminho”, afirma o morador. Em 1990, a ilha de Cotijuba foi transformada, através de Lei Municipal, em área de Proteção Ambiental.

Placa informativa das ruínas foi retirada (Foto: Divulgação)

PLACA

Além do tráfego do bonde, o DIÁRIO ainda flagrou a circulação de um caminhão-tanque pelo local. O veículo chega a transitar a poucos centímetros de distância das paredes em ruínas. O caminhão tem adesivos de identificação da Prefeitura de Belém. Frequentadora da ilha há muitos anos, a manicure Arlete Carvalho, 42 anos, atentou para outra mudança.

A placa de identificação das ruínas, que antes era vista na frente do presídio, não está mais no local. “É uma pena que esse local seja tão abandonado porque é importante sabermos a história”, avalia. “Eu acho que, pelo menos durante as férias, deveria ficar um guia lá na entrada para explicar a história do local. Cotijuba não é só praia, tem muita história também”. Segundo os moradores, a placa também foi retirada durante as obras de pavimentação. Hoje, a única sinalização que se vê às proximidades é uma da Prefeitura que aponta a conclusão da obra de pavimentação.

Uma matéria publicada no site do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan) aponta que, em 2010, as ruínas de Cotijuba chegaram a ser incluídas em um projeto prévio do PAC das Cidades Históricas no Pará. O projeto previa a “Restauração e Adequação do Educandário Nogueira Farias – Cotijuba em Eco Museu”. Em nota, porém, o Iphan informou que o Educandário Nogueira Farias não encontra-se entre os bens culturais tombados pelo Iphan” e que, em relação ao PAC das Cidades Históricas, a matéria localizada trata de uma primeira proposta elaborada para o programa, no ano de 2010, com um escopo inicial que foi alterado, quando da efetiva concretização do programa pelo Governo Federal, em 2013.

Miguel lembra que mudança no trânsito começou com obra da prefeitura (Foto: Wagner Santana)

Caminhão da Prefeitura transita muito próximo dos muros das ruínas (Foto: Wagner Santana)

Quase um século depois, pouco sobrou do Educandário

Criado na década de 30, durante o governo de Magalhães Barata, o Educandário Nogueira de Farias tinha a missão de capacitar jovens infratores para o mercado de trabalho. Quando passou a ser utilizado como presídio, em 1968, porém, o local virou cenário de histórias de torturas e maus tratos.

O historiador Michel Pinho, 42 anos, conta que o projeto do educandário era segregar os jovens infratores que assolavam Belém no início dos anos 30. “Belém do final dos anos 20 não era mais a grande metrópole da borracha como havia sido no final do século XIX”, contextualiza. “Os graves problemas sociais afloraram com mais intensidade e, entre esses problemas, estava a criminalidade infantojuvenil. Isso explica porque o Estado resolveu criar o reformatório”.

Quando o educandário deixou de existir, as práticas de tortura eram comuns e geravam o pavor dos presos que eram encaminhados para aquela unidade prisional. Relatos de moradores contam que, na época, Cotijuba chegou a ficar conhecida como ‘A ilha do Inferno’.

O professor Michel Pinho aponta que as atividades do presídio encerraram após uma revolta dos internos. “Em 1976 houve uma enorme rebelião de presos que quase tirou a vida do diretor do estabelecimento, Teodorico Rodrigues”, conta. “A revolta dos presos foi tão intensa que, além de quebrarem o pulso do diretor, o jogaram na água. Ele foi resgatado quase morto em outra ilha próxima”, lembra.

Resposta - Prefeitura

Em nota, a Prefeitura de Belém diz que a restrição para o tráfego de veículos pesados na Avenida Magalhães Barata, em Cotijuba, foi necessária para a consolidação do solo que sustenta os blocos de concreto, bem como a perfeita acomodação dessas peças, que foram previamente fabricadas. Nos próximos dias os veículos retornarão ao itinerário normal. A respeito da placa de identificação das ruínas, a Semob informa que o local está dentro do projeto de sinalização turística do município e, em breve, também receberá nova identificação.

(Cintia Magno/Diário do Pará)

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