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Jornalista Claudia Giudice fala sobre novo livro

Imagine o que é passar mais de duas décadas se dedicando a um alto cargo de uma das maiores empresas do Brasil. Trabalhar por ela, vestir a camisa - e pelo tempo de ocupação do posto, naturalmente, com o passar dos anos, planejar aposentadoria e outras c

Imagine o que é passar mais de duas décadas se dedicando a um alto cargo de uma das maiores empresas do Brasil.

Trabalhar por ela, vestir a camisa - e pelo tempo de ocupação do posto, naturalmente, com o passar dos anos, planejar aposentadoria e outras coisas. Aí o dono da empresa lhe chama de lado, num dia qualquer, anuncia sua demissão e se limita a dizer que trata-se de uma reestruturação. A paulista Claudia Giudice, hoje empresária, passou por isso há pouco mais de um ano. E como qualquer um no lugar dela, se viu meio sem rumo, como se parte de sua identidade estivesse sendo tomada. Comandando à época equipes que somavam mais de 200 pessoas, ela não saiu em busca de outro emprego nem se deixou levar pelo desespero. Já dividindo a sociedade de uma pousada em Salvador (BA), há algum tempo, e com planos de se dedicar integralmente ao negócio quando chegasse a aposentaria, transformou esse plano B em plano A. E foi além. Decidiu dividir com a internet as angústias de passar por uma mudança tão radical às vésperas dos 50 anos de vida. Dessa “terapia em praça pública”, como ela chama, nasceu um projeto que gerou, dentre outros, o livro “A Vida Sem Crachá” (Editora Agir), lançado em setembro passado. “O grande lance aí é entender que alguns ciclos precisam se fechar e que é, sim, possível se reinventar. E que ter um plano B é algo fundamental para qualquer um”, ensina.

P: Você passou 23 anos trabalhando na editora Abril. A demissão foi uma surpresa?

R: Foi. Não estava esperando. Imaginava que ficaria lá até me aposentar, tinha planos, faltavam só seis anos para que isso ocorresse. Foi um longo processo até que eu me acostumasse. Por isso conto essa história logo no primeiro capítulo do livro, com riqueza de detalhes.

P: Foi uma baixa? Crise?

R: Foi uma reestruturação. Isso acarretou na demissão de 15 diretores. Entre eles, eu.

P: Passado o susto, o que fez? Tomou logo a decisão do que fazer ou se deu um tempo?

R: De lá para cá eu criei uma plataforma em torno disso, que embasa o [livro] “A Vida sem Crachá”. Toda essa transformação virou uma série de coisas, como o blog. Fiz da escrita uma terapia.

P: E como foi isso?

R: Tive um insight enquanto resolvia um problema burocrático dias após ser demitida, do tipo “escreva”. Costumo dizer nas palestras que foi uma voz que soprou no meu ouvido, porque veio tudo pronto, o nome, a ideia. Fui ao INSS, resolvi meu problema, cheguei em casa e comecei a escrever. O blog repercutiu de cara. Aí continuei escrevendo.

P: Dessa terapia para a ideia de escrever um livro, houve um fator decisivo?

R: Um desses desdobramentos foi o convite para o livro a partir de um post em que eu falava do que significava, aos 49 anos de idade, aprender uma coisa nova. No caso era fazer suco de laranja, porque eu tenho a pousada na Bahia, e quando perdi o emprego comecei a trabalhar lá com mais frequência. Antes eu ia só aos finais de semana. Era meu plano B, enquanto eu ainda estava empregada: em 2020 eu iria tocar a pousada direto. Tive que antecipar esse processo, e eu estava lá, trabalhando, e resolvi aprender a fazer o suco para o café da manhã, e escrevi sobre isso. Uma coisa tão simples e banal, mas aos 49 anos existe beleza nisso. E esse post foi lido por uma editora que me chamou para fazer o projeto do livro. Foi aprovado e eu comecei a fazer mais posts que foram viralizados, em que falava exatamente da dor da perda do crachá.

P: E como foi a repercussão desses posts?

R: Desse processo todo, do post que nem foi no meu blog, que foi no Projeto Draft, e viralizou, com quase 500 mil views, vi que tinha muita gente passando por isso. A única coisa diferente é que eu tinha falado abertamente sobre um assunto que é um tabu, as pessoas têm vergonha de falar que foram demitidas. E eu falava abertamente e tudo o que significa perder o crachá. É perder o sobrenome, deixar de ser a Fulana, do jornal tal.

P: A questão de perder o telefone funcional, a rotina...

R: Exato. Fui falando dessas vivências e foi repercutindo. Aí antes de lançar, eu percebi que tinha uma oportunidade de construir uma plataforma de comunicação. Foi então o blog, o site, o livro para desdobrar em palestras e consultorias. E é o que eu tenho feito, sigo nisso, na minha pousada. E eu não supunha que crise ia recrudescer do jeito que recrudesceu. O resultado foi mais pessoas perdendo o emprego, vivendo isso. Deixou de ser uma questão localizada ali no setor de Comunicação, passando a ser questão do Brasil, em várias profissões.

P: Você viveu um reaprendizado ou adaptação?

R: Com certeza foi um reaprendizado. Hoje tenho outra rotina. Com a vida que eu levo e a decisão de não voltar a ter outro emprego com crachá, tenho um tipo de vida diferente. Minha equação é: a minha liberdade depende da minha situação financeira, segurança financeira, eu uso essa expressão. Então quanto menos custo, maior liberdade e segurança. O resultado é isso, estou saindo de um apartamento enorme para outro menor. Para poder exatamente gastar menos. Adequar meu comportamento, meu consumo, à nova realidade, sempre nessa linha para ser livre do crachá. E tenho dez funcionários que dependem de mim para ter salário no final do mês.

P: Interessante de ver que hoje você chama de liberdade o que antes chamava de perda...
R: Acho que aí nesse processo todo o interessante é entender que um ciclo tinha acabado. Eu já tinha escalado uma altura que jamais pensei que chegaria na empresa. Para mim, já tinha dado. Para o que gosto de fazer não tinha mais para onde ir e resolvi fazer diferente. E tudo está funcionando muito bem.

P: Mas você tinha um plano B. Nem todos têm...

R: Por isso, acho que hoje todo mundo, independentemente de idade e profissão, precisa ter um plano B. Mesmo que você não perca o emprego. Aos 55, eu ia me aposentar, mas não ia parar de trabalhar. Porque a gente vai viver até os 70, no mínimo. Então, o plano B é fundamental. A vida ficou longa e as pessoas vão ter uma, duas, três, às vezes quatro carreiras. Isso é o bacana. Ganhar a liberdade de escolher outras coisas.

P: É toda uma construção, né? Não é algo rápido...

R: Não é. Eu sempre fui toda organizada, tinha meu plano pra 2020. Mas tem muita gente que não sabe o que vai fazer amanhã. Para esses casos, claro que é mais complicado. Mas essa situação de crise está acendendo uma luz amarela. Temos quase duas gerações no Brasil que não sabem o que é crise, porque nasceram, cresceram e tiveram adolescência em um Brasil que estava crescendo. Diferente da minha. Quando eu comecei a trabalhar, o Brasil sofria com uma hiperinflação.

P: Se alguém te chamasse de volta ao crachá, o que faria?

R: Não sei. Nunca ofereceram e não fui atrás. Naquilo que eu gosto de fazer, todos os lugares onde eu gostaria de trabalhar estão vivendo uma crise profunda.

P: A pousada virou o plano A. Descartas um novo plano B?

R: Plano A é a pousada. O B é escrever, seguir publicando e ganhar dinheiro com isso.

P: Sua vida mostra que não precisa se desesperar, que nem somos tão dependente de uma carteira de trabalho assim...

R: É possível se reinventar, começar de novo a qualquer momento da vida. O grande lance é ser capaz de lidar com perda e mudança. No fundo, o que está nessa história toda é mudança, é encarar, sair.

(Carolina Menezes)

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