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Taxista conta sobre sequestro sofrido pelo marido

O Pará não vai esquecer da cena tão cedo. Olhos marejados e dentes trincados, a taxista Flávia Macedo, 42 anos, escancarava seu ódio e sua indignação diante das câmeras de TV. As palavras saíam de sua boca carregadas de revolta e impotência. Não era para

O Pará não vai esquecer da cena tão cedo. Olhos marejados e dentes trincados, a taxista Flávia Macedo, 42 anos, escancarava seu ódio e sua indignação diante das câmeras de TV. As palavras saíam de sua boca carregadas de revolta e impotência. Não era para menos. Flávia acabara de passar pela pior agonia da sua vida.

Naquela noite - última quarta-feira (22) -, seu marido, o também taxista Fábio dos Santos, 42, havia sido sequestrado e tomado como refém por dois homens. Ao tentar fugir da polícia, durante uma perseguição no bairro de Batista Campos, os criminosos acabaram batendo no carro de Fábio. O veículo, que significava o sustento da família, ficou destruído. Era o início do inferno para o casal, que tem três filhas, de 19, 15 e 13 anos.

Enquanto o marido estava sob o domínio dos bandidos, com o cano de um revólver 38 colado em sua cabeça, Flávia recebeu o telefonema de um amigo da família, informando sobre o incidente. Ela não pensou duas vezes. Pegou o seu carro e foi direto para o local do crime. Chegou a tempo de ainda ver o marido tremendo de medo, com o cano do 38 na cabeça. Foi quando deu a declaração que comoveu a todos: “Trabalhar o dia inteiro, pra ficar com uma arma na cabeça. É justo isso? E o governador tá onde? Dormindo? Passeando, em Paris? É justo?”.

A sofrida sequência de interrogações repercutiu em todo o Estado e ganhou as redes sociais. Apenas na página do DIÁRIO no Facebook, o vídeo que mostrava sua revolta foi assistido por mais de 171 mil pessoas. Agora, exatamente uma semana após o episódio, Flávia fala, pela primeira vez, sobre aquela noite de tormento e tudo o que ela gerou na sua vida.

Numa comovente entrevista exclusiva, que concedeu no apartamento em que mora, de aluguel, em Ananindeua, ela fala sobre as dificuldades financeiras que tem enfrentado sem o táxi do marido, da dor de ver o companheiro sob a mira de uma arma e da revolta contra os políticos que comandam o Estado. E revela um dos motivos da sua indignação contra o governador Simão Jatene. Sua voz se une à de toda a população paraense, cansada de viver sob eterno clima de medo, violência e injustiça.

P: Como está sendo a sua vida desde o dia do assalto?

R: Não está sendo. Antes, estava dando para suprir as necessidades. O que entrava com o carro do meu marido - que, na verdade, é do pai dele - era para as despesas, como aluguel e alimentação. E também ajudava os meus sogros. Mas agora, só com o táxi que eu dirijo, não dá. Já começo o dia preocupada, devendo R$ 120 da diária que tenho de pagar ao dono do carro. Sem contar os gastos com gasolina e os R$ 20 que pago à cooperativa. Além disso, nunca sei se vou voltar pra casa viva, no final do dia. Tenho três filhas que dependem de mim, uma de 19, 13 e 15 anos.

P: Foi a primeira vez que a família passou por uma situação de violência?

R: Há três semanas, um cara entrou como cliente no carro do meu marido, umas 2 horas da tarde, na avenida Tamandaré. Próximo ao Polo Joalheiro, no bairro do Jurunas, o sujeito sacou a arma, apontou para a cabeça dele e disse que era um assalto. Meu marido teve de entregar toda a renda. No dia 28 de maio, outros criminosos colocaram a arma nas cabeças das minhas três filhas e roubaram o carro da minha tia. Duas semanas depois, a mais velha foi vítima de outro assalto, quando estava com o namorado na porta da casa da avó, no bairro do Souza. É muita violência. Vai ser difícil esquecer esse período do ano nas nossas vidas.

P: Que sensação a senhora teve quando viu seu marido na mira de um revólver?

R: Foi humilhante demais! Ver meu marido com os braços para cima, fora do carro, com uma arma apontada para a cabeça doeu muito. É humilhante a gente trabalhar e, quando chega o final do dia, destruírem nosso patrimônio, nossa fonte de renda, assim...em frações de segundos. Na delegacia, o pessoal das ONGs de Direitos Humanos chegou para dar atenção ao bandido, mas não apareceu sequer um psicólogo para o meu marido. Eu pago tanto imposto. Seria muito o governador Simão Jatene fazer uma vaquinha e dar um carro para o meu marido? Seria justo que ele cobrasse ICMS das grandes indústrias. Mas elas não pagam impostos porque o governador não quer. O poder público não está nem aí para o povo

P: Por que, no momento do incidente com o seu marido, a senhora fez questão de citar o governador?

R: Porque ele é o principal culpado. Não tem outro. É ele. A culpa é de quem está no poder. Não vou culpar a família dos criminosos. Se eles chegaram a esse ponto, é porque não têm emprego. A situação do Pará está assim porque o Governo não gera nada para a família. Eu queria colocar Jatene dentro de um carro e levar até uma invasão, pra ele ver o que é pobreza. O povo não tem emprego, não tem educação, não tem nada. Meu marido estava com uma arma apontada para a cabeça. E onde estava o governador? Dormindo? Jantando? Passeando em Paris, nas férias de julho?

P: A senhora sente falta da presença do governador no comando do Estado? É isso?

R: Sim. Ele é o chefe maior de Estado. Mas cadê? Ninguém sabe. Jatene virou as costas para a população. Cidadão de bem sofre o diabo pra viver, e a autoridade máxima do Estado lava as mãos. Não está nem ai. Já cruzei várias vezes com Jatene no shopping. Ele sempre anda cercado por seguranças. Enquanto isso, nós, trabalhadores, não temos segurança do Estado. Não temos carro blindado. Não temos nada. Ele deveria dar, ao menos, condições pra gente poder andar nas ruas, sem medo de morrer. É isso que eu não consigo entender. Será que ele não vê o povo paraense sofrendo? Ele não faz nada! Eu espero que, um dia, ele tome vergonha na cara e dê um jeito na insegurança. A gente paga pra isso. Ele aparece na televisão e diz que a criminalidade diminuiu. Diminuiu? Onde? Meu marido é apenas mais um nas estatísticas. Eu queria que o nosso caso fosse o último nas estatísticas de violência no Pará. Mas sei que não será.

P: A senhora votou em Jatene?

R: Votei. Infelizmente, votei neste homem. Acreditei na mudança que ele prometeu. Acreditei que ele ia melhorar a vida dos professores. Só promessa. Tudo balela. Minhas filhas estudam na rede pública estadual. O mês de julho está acabando, e elas não fizeram nem a primeira avaliação. Quem sabe, se eu tivesse votado na oposição, tivesse mudado isso. Votei errado e me ferrei! Eu votei nele e hoje me dou ao direito de cobrar. Na hora que eu mais preciso, ele não se manifesta.

P: O que a senhora sente?

R: Decepção. Muita raiva.

P: Votaria em Jatene novamente?

R: Jamais! Eu me arrependo amargamente de ter acreditado nas mentiras dele. Mas isso é bem feito pra todo nós que votamos neste sujeito. Ao invés de pensar, a gente joga o voto na lata do lixo. A urna virou penico. O pobre está cada vez mais pobre. A classe média está caindo. A crise está enorme.

P: Agora, qual a sua maior preocupação?

R: O que mais me preocupa é como vamos pagar o nosso aluguel, que é de R$ 400, e com que dinheiro vamos comprar a comida das minhas filhas. Isso tudo me revolta muito. Estou preocupada com o carro do meu sogro, que meu marido dirigia no momento do acidente. Meu sogro é doente, sofre com problema renal. É desesperador. Eu não quero que ninguém me dê o peixe. Só quero a vara para pescar. Está tudo muito complicado. E cadê as autoridades para ajudar? Abrir um processo contra o Estado vai levar 20, 30 anos. É impossível o governador fazer alguma coisa pelos seus eleitores. Ele não tem caráter para isso.

P: O que a senhora pretende fazer daqui para a frente?

R: Não sei. Tiraram o meu chão. A seguradora me ligou dizendo que não irá arcar com os prejuízos do carro, porque quem estava ao volante no momento do acidente era o criminoso, e não o proprietário do veículo. Tivemos perda total do carro. Eu olho para o táxi que eu pago, e digo que é a minha casa, minha vida. Daqui a 3 anos, eu vou quitá-lo e poderei pensar em comprar a nossa casa. Eu e meu marido tínhamos planos. Se eu não conseguir pagar, como vai ser? Além disso, passamos a sentir muito medo, como nunca senti. Estou com medo de pegar passageiros nas ruas. Meu marido não está nem falando direito. Está todo dolorido, ainda em estado de choque. É tudo muito sofrido.

(Diário do Pará)

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