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Calçadas: espaço de convivência para todos

De tijolos, de cimento ou concreto, adornadas por pedras portuguesas... largas, curtas, bonitas, malcuidadas... Vias de transporte de todos os cidadãos em algum momento do dia, sejam eles ciclistas, pedestres ou usuários de automotivos, as calçadas são um

De tijolos, de cimento ou concreto, adornadas por pedras portuguesas... largas, curtas, bonitas, malcuidadas... Vias de transporte de todos os cidadãos em algum momento do dia, sejam eles ciclistas, pedestres ou usuários de automotivos, as calçadas são um espaço de convivência onde todos coabitam igualmente. Preservar esse espaço significa respeitar o direito de todos – tanto de ir e vir quanto de usufruto do espaço. E se em nossas cidades as queixas com o estado das calçadas é geral, isso fala muito sobre a importância que todos estamos dando a vários conceitos e valores mínimos de cidadania, convivência solidária e urbanismo.

“A calçada é a via do cidadão. Pensar nas calçadas, em seu bom uso e estado de conservação significa pensar no respeito ao direito do cidadão. Uma cidade que cuida bem de suas calçadas tende a ser uma cidade onde o direito dos cidadãos é respeitado”, explica o arquiteto e urbanista Paulo de Castro, professor dos cursos de arquitetura da Universidade Federal do Pará e Unama.

“No meu bairro, o desrespeito começa com o fato de não haver calçadas”, comenta Jessé Aquino, morador do bairro de Águas Brancas, em Ananindeua. Quando transita em Belém, Jessé se sente constantemente desconfortável com essas vias. “No bairro do Comércio, é praticamente impossível andar na calçada, de tão ocupada ou esburacada. A gente divide a rua com carros, motos e ônibus”, reclama.
Já Claudiane Teixeira, moradora do bairro do Julia Seffer, em Ananindeua, vê na falta de planejamento das calçadas outros problemas. “Os gestores cobrem vias de barro com asfalto, mas não fazem o calçamento. O resultado é que, quando chove, a lama se desprende da pista e invade a casa das pessoas”, protesta.

OUTROS PASSEIOS

As queixas são inúmeras e muito parecidas. Da falta de planejamento público, má conservação dos espaços ou simplesmente falta de bom senso do espaço, praticamente todos os moradores do Estado são vítimas de desrespeito ao seu direito básico de ir e vir.

Mas, embora sejam constantemente criticadas pelo estado de conservação ou pelo uso abusivo que é feito do seu espaço, as calçadas da cidade de Belém também conservam bons exemplos de comportamento cidadão, como o de uma pequena vila em um dos bairros periféricos de Belém. Em meio a dificuldades, os moradores da passagem Pracinha, no bairro da Terra Firme, surgiram como agentes do bem que encontraram forças para promover a mudança - como a transformação de uma cidade, que pode começar na frente de casa.

A passagem fica entre duas vias grandes e bastante movimentadas da Terra Firme – a passagem São Domingos e São Leopoldo. Apesar do movimento intenso na vizinhança, a Pracinha era quase uma ponte sobre piçarra até a segunda metade dos anos 1990. “A prefeitura nunca havia pisado aqui para fazer uma melhoria. Como não fazia nas passagens vizinhas, sentimos que teríamos que fazer algo nós mesmos”, justifica Maria Helena Soares da Paixão, 60.

Moradora da passagem há 40 anos, dona Helena fez parte do grupo de vizinhos que se organizou e foi até a prefeitura de Belém para propor uma mudança. “Dissemos que faríamos nós mesmos a obra e foi assim que fizemos. Organizamos bingos e festas, fizemos coletas e reunimos recursos para comprar o cimento, a tubulação e o resto do material. Entre nós mesmos montamos o esquema de tubos e encanamentos da rua, ligando às casas. A única parte do trabalho que Secretaria de Saneamento teve foi enviar pessoal para fazer a cimentação, porque isso ninguém da passagem sabia fazer”, explica dona Helena.

E a ação conjunta ajudou a mudar a feição da vila. Foram cerca de dois anos entre o início da organização e primeiras ações para angariar recursos até a inauguração da via, em 1997.

“Alguns moradores não falavam com outros moradores daqui. O povo era muito dividido, mas o mutirão envolveu toda a comunidade. Durante a cimentação, os moradores sempre se revezavam oferecendo comida, água e ajudando como podiam os operários da Sesan”, relembra Helena.

Até hoje os moradores da rua mantêm os cuidados em conjunto. Todo sábado, um morador é designado e realiza a limpeza dos entulhos nas valas. Cada morador cuida do seu pedaço de calçada e os custos de reformas são divididos entre os moradores. Quando falta alguma coisa, a comunidade volta a realizar bingos e festas para inteirar a receita. Tudo isso sem comando, seja de uma prefeitura, seja mesmo de associação de moradores. “Não temos associação. As coisas são decididas entre a gente nas conversas do dia a dia. Todo mundo vê o benefício para a rua, então todo mundo acaba ajudando. Até as pessoas que não moravam na época mas se mudaram para cá acabam entendendo e participando”, sorri dona Helena.

A participação das pessoas é apontada pela moradora como o diferencial para uma mudança na realidade das calçadas de Belém. “Vamos dizer que o problema seja metade culpa do poder público e metade do comportamento das pessoas. Se as pessoas ficarem esperando o poder público mudar e ele não fizer nada, então não acontece mudança nenhuma. Mas se elas começarem a fazer as coisas por elas, a transformação acontece e aí o poder público vai ter que fazer a sua parte também”, decreta Helena.

Buracos nas calçadas - e na legislação também

Passear por Belém é se aventurar por uma miríade de cores, cheiros, sons, sabores e também pela chocante variedade arquitetônica que se faz sentir desde as calçadas. Além das naturalmente diferentes calçadas construídas em outros períodos, como as do centro histórico - cujas medidas já não comportam tão bem o fluxo de movimento nas ruas -, cada fachada de casa guarda um presente da criatividade egoísta de seu dono.

Não raro as calçadas não têm continuidade e se fazem degraus forçados e extensões de garagem, atravancando o trânsito de pessoas. Haverá na legislação alguma forma de proteção para o pedestre e seu direito de trânsito e ao espaço de convivência? Sim e não.

De forma objetiva, não há uma legislação específica sobre calçadas – embora várias leis façam menções a qualidades das calçadas. No Código de Posturas do Município o título VII, o artigo 120 e 123 determina que a licença para barracas de flores, frutas e comidas e bancas de revista e jornais típicas não devem obstruir o trânsito.

O artigo 124 determina que a área de uma banca não deve ser superior a 1/3 da largura da calçada. No plano diretor municipal também não há uma legislação sobre calçadas, embora se oriente que elas sigam as normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e propiciem o bom fluxo de pessoas. E a ABNT apresenta inúmeros padrões e medidas para calçamentos, sem apresentar um ideal, mas sempre orientando sobre a importância da acessibilidade nas obras.

“O problema maior não é legal, é de bom senso. Se o pensamento no ganho coletivo funcionar e houver aplicação dos princípios do Plano Diretor pela gestão, todos os problemas podem ser enfrentados”, define o professor Paulo de Castro. O arquiteto destaca que não existe um tipo ideal de calçada e que para as condições de cada rua há um tipo diferente de calçada que se adapta melhor, mas que o bom senso deve guiar a escolha.

“A maioria das cidades do Brasil padece por causa de dois problemas em comum: falta de planejamento urbano e projetos de urbanização cujos prazos são atrelados a um mandato político. Para se organizar as calçadas e vias de uma cidade, é necessário que o planejamento seja de médio e longo prazo, para além da gestão de um único político ou grupo político, mas uma obra pensada para a cidade e quem morar nela”, afirma Paulo.

(Diário do Pará)

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