Paraense Dirceu Maués abre mostra em Brasília com imagens feitas a partir de pinhole

O paraense Dirceu Maués abre hoje sua segunda exposição individual em Brasília. A primeira foi em 2011 pela Funarte. Agora, ele tem seu trabalho mais recente lançado pela galeria Karla Osorio, que o representa. “Olhares: Dispositivo | Paisagem” mostra, em cerca de 50 imagens e duas instalações, a relação que o artista iniciou em 2003 com a fotografia, o cinema e o vídeo, a partir de pesquisas com a construção de câmeras artesanais e a experimentação de diferentes técnicas.

As obras fazem parte de três séries que Dirceu produz atualmente. “Extremo Horizonte” é formada por grandes imagens panorâmicas de cidades brasileiras como Goiânia, Belém, Fortaleza, São Paulo, Recife, a própria Brasília, e algumas da Europa, como Amsterdã. O trabalho iniciado em 2011, com uma bolsa da Funarte, e que lhe rendeu a primeira exposição em Brasília, baseia-se sempre em paisagens urbanas e no uso de câmera pinhole. “Isso cria certa distorção da imagem. Você não sabe a perspectiva exata, porque às vezes eu passava dos 360 graus, dando mais de uma volta completa com a câmera. Também surgem alguns arrastamentos e áreas mais nítidas que outras”, comenta o artista.

1 e 2 Imagens que estão na exposição “Olhares: Dispositivo | Paisagem”. (Fotos: Dirceu Maués/Divulgação)

Registro da instalação que faz parte da mostra, com câmeras escuras feitas a partir de tambores. (Foto: Dirceu Maués/Divulgação)

Outras imagens são desdobramentos da série de instalações “(In)versões na Paisagem” feitas com câmeras escuras em intervenções urbanas, a maioria realizada em Brasília, mas também com versões em Belém, por meio do Prêmio Diário Contemporâneo de Fotografia, realizado pelo DIÁRIO DO PARÁ, em 2015 e 2016. Transeuntes podiam ver através das câmeras artesanais uma versão invertida da paisagem por onde estavam passando. “E as imagens têm movimento, cor, projetam tudo o que passa diante da lente, atravessa e é projetado dentro da caixa”, explica. Na exposição, estarão registros feitos por Dirceu dessas intervenções, que ocorreram em locais como a rodoviária de Brasília, em 2015.

As instalações que compõem a mostra também permitem ao público algumas dessas experiências presentes nas duas séries. Ao invés das caixas de papelão ou de madeira, tambores formam câmeras escuras para o público ter a mesma experiência das intervenções de “(In)versões da Paisagem”. A janela da galeria também foi desmontada, deixando apenas as armações, para virar uma grande câmera escura. “Quando você entra na galeria, vê a paisagem projetada na parede de forma invertida”, explica Dirceu.

A última série a compor a mostra é “Incerta Paisagem: Imaginário de Luz e Prata”, produzida a partir das experimentações do artista com a fotografia quimigrama. Trata-se de uma pintura usando os produtos químicos usados na revelação fotográfica sobre o papel fotossensível. “Com o pincel vou pintando sobre o papel, o químico vai reagindo e vão surgindo essas paisagens de horizonte meio sombrio, com céu, nuvens, mas que é tudo uma reação química, tudo ilusão”, conta o artista.

O rudimentar é um universo de possibilidades

Quando começou a fotografar, Dirceu já tinha experimentado a fotografia pinhole em várias oficinas e seu interesse por ela só fez crescer ao longo da carreira, que ainda inclui a atividade de fotojornalista em jornais como o DIÁRIO. “Tem um pouco das brincadeiras de infância, você troca o brinquedo, sabe? Quando criança, eu construía meus próprios brinquedos. Quando você começa a fotografar aprende a construir sua câmera com a técnica pinhole. Eu vi uma potência nessa forma bem simples de usar a câmera, o dispositivo”.

A imagem com pontos desfocados e inúmeras interferências visuais pelo próprio processo lento de captura da imagem é vista pelo artista como um novo filtro para a sua fotografia. “Construir a câmera, trabalhar com filme e não papel, quando comecei a ver que isso abria um universo de possibilidades dentro da fotografia, decidi que era por esse caminho que queria seguir”, conta Dirceu.

Ele destaca ainda as texturas únicas e a temporalidade do processo. “Tem também certa expressão desse tempo na imagem”, afirma. A prática tornou-se ainda uma questão política, ir contra o discurso vendido pelas grandes marcas de que é necessário um equipamento extremamente grande imagem. “Não que eu vá negar a qualidade de um bom equipamento, mas acho que cada tecnologia nova é mais uma ferramenta que você pode combinar com outras, e não substituir as anteriores”, considera.

Em seu trabalho, Dirceu acaba realizando justo isso. As panorâmicas feitas com caixa de madeira são digitalizadas no scanner antes de serem impressas em papel fineart.

Morando atualmente em Belo Horizonte, Dirceu Maués aborda estas questões em sua pesquisa de doutorado na Universidade Federal de Minas Gerais. O paraense, que também já residiu em Brasília por cinco anos para o mestrado em Artes Plásticas na UnB, já realizou exposições individuais em Berlim, Montevidéu, Katowice (Polônia), São Paulo, Rio de Janeiro, Porto Alegre, Curitiba e Belém. Assim como recebeu diversas premiações, entre elas, o Prêmio Brasil Fotografia 2013, o XII Prêmio Funarte Marc Ferrez Fotografia 2012 e a Residência Artística–WBKVrije Academie Haia, Holanda.

(Lais Azevedo/Diário do Pará)