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Pesquisadoras e escritoras questionam falta de representatividade na Feira do Livro

As vozes não incluídas na programação da Feira Pan-Amazônica do Livro mais uma vez se fizeram presentes nas críticas que antecedem sua realização. A ausência de mulheres, em especial autoras negras e indígenas, na programação principal da 22ª edição do ev

As vozes não incluídas na programação da Feira Pan-Amazônica do Livro mais uma vez se fizeram presentes nas críticas que antecedem sua realização. A ausência de mulheres, em especial autoras negras e indígenas, na programação principal da 22ª edição do evento, que ocorre de 26 de maio a 6 de junho, em Belém, é um dos questionamentos. Mas os protestos começaram logo depois da divulgação do cartaz do Salão do Livro em Marabá, um dos braços do evento literário, que será aberto amanhã (27).

A peça, com a imagem de uma mulher negra equilibrando livros sobre a cabeça, para a Secretaria de Estado de Cultura (Secult), realizadora do evento, era uma referência às palenqueras, mulheres que tradicionalmente usam roupas multicoloridas com bacias de frutas encimando as cabeças, na Colômbia, país homenageado desta edição. Para muitos, a imagem foi repudiada como machista, racista e com discurso colonizador. Diante da repercussão muito negativa, a Secult, mesmo declaradamente a contragosto, decidiu substituir a peça por outra, com uma imagem do artista plástico colombiano Fernando Botero, o que não foi suficiente para diminuir o tom das críticas.

O Grupo de Estudo e Pesquisa Eneida de Morais (Gepem), da UFPA, com mais de 20 anos de estudos sobre questões de gênero e formado por pesquisadores de diversas áreas do conhecimento, se pronunciou com uma nota de repúdio pedindo que os realizadores reflitam sobre as imagens que divulgam e não apenas ignorem o debate ao fazer uma substituição. “O referido cartaz relaciona-se com essa história de sujeição e luta, ao retratar a mulher negra colombiana e latino-americana como alguém que simplesmente carrega livros, mas não os elabora e escreve. Desse modo, reproduz um imaginário patriarcal e racista, que não valoriza a mulher como produtora do conhecimento”, pontua a nota.

O grupo também rebate os argumentos da Secult, divulgados em nota oficial, de que a imagem teria sido incompreendida pelas pessoas e retirada de seu contexto. “Na tentativa de representar a diversidade da cultura colombiana, (a imagem) acabou por reproduzir a lógica da colonialidade que subalterniza a mulher negra latino-americana”, diz a nota de repúdio do Gepem, afirmando que a Secult ignorou a história de luta e resistência das palenqueras contra a escravidão, o colonialismo, o racismo e o patriarcado.

Cartaz que foi alvo de críticas (Foto: divulgação)

PROGRAMAÇÃO PARA DESVIAR DAS CRÍTICAS

A polêmica envolvendo a Feira Pan-Amazônica do Livro não se restringiu à questão do cartaz. Um grande movimento de reação surgiu também nas redes sociais com enfoque na programação. A escritora paraense Paloma Franca Amorim foi uma das que rebateram a forma como foi tratado o assunto, sem que a Secult apresentasse um projeto de diversidade étnica e de gênero no evento, “além de não explicar a incursão repetitiva na projeção de grandes editoras do Sudeste em detrimento do apoio aos editores, livreiros e escritores locais”.

A também escritora paraense Gabriela Sobral, responsável por trazer para Belém o projeto nacional “Leia Mulheres”, que destaca o trabalho de escritoras, diz que vê com surpresa e preocupação a repetição dos mesmos erros em mais uma edição da feira literária. “A gente já falou tanto, já realizou tantos eventos, formou clubes para fomentar e incentivar a produção de livros pelas mulheres, tantas mesas que falam da presença das escritoras negras. A própria ‘Feira Literária do Pará’ (FliPa) do ano passado teve ampla participação de intelectuais e escritoras negras, pessoas de outros estados, a própria Paloma Amorim… Acho até um pouco de violência você silenciar mais uma vez essas pessoas, não dar esse espaço, indo contra todas as feiras que têm sido realizadas no país e no mundo, tentando suprir essas questões. Você ter uma Feira Pan-Amazônica, uma região de completa diversidade, e não responder a essas questões é uma violência”, afirma Gabriela.

A FliPa a que Gabriela Sobral se refere nasceu da união de escritores paraenses reconhecidos nacionalmente, como Salomão Larêdo e Edyr Augusto, cansados de ficar em segundo plano na programação da Feira Pan-Amazônica. Com três edições realizadas em parceria com a livraria Fox e a editora Empíreo, a FliPa publicou a primeira obra de três autores, entre eles, Giuliana Paixão, em 2017, e promoveu no mesmo ano um encontro da nova geração de escritoras mulheres paraenses, incluindo nomes como Roberta Splinder. Também fez uma grande homenagem a Lindanor Celina, trazendo suas obras e debatendo sua produção.

A CONTRAGOSTO

A Secult tentou aplacar as críticas. Substituiu o cartaz e convidou duas autoras para compor o Salão do Livro em Marabá, incluindo a ativista do movimento negro Vanda dos Santos, para uma mesa criada em cima da hora sobre literatura e negritude. Mas, ao que parece, as mudanças vieram a contragosto.

Em entrevista à “Folha de São Paulo”, o secretário de Cultura Paulo Chaves reforçou o posicionamento de sua pasta ao dizer que houve “um preconceito inverso”. “As pessoas descontextualizaram o elemento do cartaz”, disse.

No entanto, o público soube interpretar o novo cartaz como uma indireta. Nele, junto à obra de Botero, surge a citação ao escritor Gabriel García Márquez: “Para entender outra cultura, ‘tudo é questão de despertar sua alma’”. E não faltaram respostas ao secretário nas redes sociais. “A Secult acha que somos o quê? Imbecis? Disse claramente que houve má interpretação? É subestimar demais a mente das pessoas”, comentou uma internauta na página, e que foi sucedida de outras: “Não adianta mencionar o passado e nem sequer o ano passado para se defender. O cartaz é desse ano, a ausência de autoras negras é desse ano. Curadoria racista”, criticou outra. “Pra Secult do Paulo Chaves, mulher só serve pra ilustrar cartaz carregando livro na cabeça: nenhuma escritora está entre os principais convidados da Feira Pan-Amazônica do Livro. Será uma nova categoria, a misoginia literária?”, provocou o internauta.

(Laís Azevedo/Diário do Pará)

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