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Projeto quer guardar história das aparelhagens

Darien Lamen nasceu em Nova York, mora no estado americano de Wisconsin e é professor de Etnomusicologia – antropologia da música. Ele veio para fazer intercâmbio no Brasil, conheceu o forró e viajou pelo país inteiro – conheceu as músicas regionais. “No

Darien Lamen nasceu em Nova York, mora no estado americano de Wisconsin e é professor de Etnomusicologia – antropologia da música. Ele veio para fazer intercâmbio no Brasil, conheceu o forró e viajou pelo país inteiro – conheceu as músicas regionais. “No exterior o que eu conhecia de música brasileira era apenas a Bossa Nova e a Tropicália, mas nem tanto. E aqui eu vi que tinha muita musica regional interessante”.

Quando ouviu a guitarrada pela primeira vez, aqui no Pará, Darien conta que achou muito parecida com a música de certas regiões da África, também influenciadas pela música caribenha. “Só que o Mestre Vieira, que meio que formulou a guitarrada, já tinha formação no blues e no choro, gostava muito da música americana, e acabou misturando tudo. Por isso, ouvir a guitarrada pela primeira vez foi algo diferente e familiar ao mesmo tempo”.

Darien veio para Belém pela primeira vez em 2009, ele preparava sua tese de doutorado para a Universidade da Pensilvânia. “Eu queria fazer um estudo sobre a história da lambada e a influência da musicalidade caribenha no Norte do Brasil”. Nessas idas e vindas, o rumo tomado por ele chegou até outro grupo de pessoas – o das aparelhagens.

“Vi que tinha toda uma história relacionada com certas pessoas; que construíam a aparelhagem, que mandavam buscar vinil do exterior para tocar, encomendavam discos de merengue que não eram lançados no Brasil, através do contrabando mesmo”. E ele quis saber como as pessoas viviam disso. O americano, que antes não tinha qualquer ligação com o Brasil, foi entrando nessa história e hoje diz se identificar bastante com ela.

“Meu avô também aprendeu a construir computadores sem formação nenhuma, talvez essa seja uma historia que faz parte das Américas: o fascínio pelo equipamento eletrônico. As pessoas pegam essa tecnologia, se apropriam dela e passam a trabalhá-la de uma nova forma”. Mas Darien não estava sozinho nesse encanto pela história das aparelhagens.

Sonoros surgiram na década de 1950

Milton Almeida Júnior, ou apenas Júnior, é filho de Milton Almeida. Hoje com 70 anos, o “Milton Pai” é uma parte importante da história contada pelo filho e que encantou Darien Lamen. Ele foi quem construiu nas décadas de 1950 e 1960 as primeiras aparelhagens de Belém. “Essas aparelhagens que existem hoje todas começaram pela oficina dele. Aos poucos, conforme foi crescendo, ele foi reunindo outros técnicos, vinham manuais de fora, e ele ia aprendendo a montar aquilo, mas muita coisa era por testes mesmos”, conta Júnior.
Milton era responsável por criar a acústica dos equipamentos, e sozinho encontrava a sonoridade que queria. “Meu pai até hoje não sabe por no papel, só sabe fazer”. Essa relação com as aparelhagens – antigamente chamadas de “Sonoros” – vem desde o ano de 1952 e pode ser contada como a história das primeiras aparelhagens. “Ele tinha um parque de diversão, a história envolve até mesmo o Círio de Nazaré, a Rádio Rauland (antiga Publicidade Rauland)”, e resume: “começou tudo junto”.

E começou muito diferente. Em festa de aparelhagem, o que hoje é chamado de DJ, já foi “controlista”. Quem falava era o locutor, porém bem menos dos que temos hoje em dia. E quem cuidava dos discos? O “discotecário”. Ele fazia a seleção musical, limpava o disco e dava para o controlista.

Ainda são poucos os que estão vivos para contar essa história, mas ainda muitos criativos e ativos. Entre eles, o locutor Edilson e o controlista Meireles, que até chegaram a trabalhar juntos. Na memória de ambos, também estão as sedes, espaços onde as festas aconteciam: o Estrelinha, que ficava na Travessa Mariz e Barros (antiga Travessa Estrela) e já foi demolido; a sede São Domingos e a Imperial, uma perto da outra, no bairro do Jurunas; e a Esporte Clube Terra Firme.

“É uma história que envolve muita gente, muitos bairros, as sedes, os bares, vem a música, o merengue, o bolero; tem o Carlos Aguiar, o Monte Carlos, que vendia os discos”, é uma grande história e que agora já reúne quatro pessoas tentando recontá-la.

O fascínio pelas aparelhgens faz parte da história musical paraense. (Foto: Arquivo pessoal)

Resgate é uma forma de homenagear criadores

Milton Júnior já tinha começado uma pesquisa sobre a história das aparelhagens e se juntou a Darien Lamen ao saber do interesse dele em fazer registros sobre a história das aparelhagens também. “Eu já tinha reunido algum material, mas não tinha aparelho pra gravar entrevista. Na semana passada [dia 27 de dezembro] começamos o museu itinerante pra mostrar os equipamentos que reunimos, e também entrou o Afonso (Galindo - documentarista) querendo fazer um filme curta-metragem”, conta ele.

Juntos, Júnior e Darien têm formulado ao longo dos últimos três anos a ideia de montar um “Museu da Aparelhagem”, planos que tiveram que ser modificados em alguns pontos, após esbarrarem na falta de recursos. “A ideia do Júnior é mostrar um pouco o lado do equipamento, das tecnologias; e eu tenho contribuído mais com lado de colher depoimentos, recolher fotos”, conta Darien.

Como ficou difícil conseguir o espaço físico, ambos decidiram montar uma espécie de museu itinerante, usando sedes antigas como a da Terra Firme e Imperial, para fazer um circuito com o material já reunido. Durante essas exposições, eles também aproveitam para receber doações e colaborações. “Estamos recuperando equipamentos antigos, vamos pegando peças aqui e ali para fazer tocar. A gente quer que tudo no museu funcione”, explica Júnior.

Um rádio à válvula e alguns toca-discos da década de 1960 e 1970 são parte dessa coleção posta pra funcionar diante dos visitantes. Darien ainda faz questão de reforçar. “Todos esses projetos são sem fins lucrativos, nós quatro fazemos por gostar. Há interesse profissional, mas pessoal também. Existe certa urgência, porque o pessoal dessa geração – que deu início a essa história - já está em idade avançada. Tem que ver como a gente faz para agilizar”.

Para o grupo, a intenção não é exatamente resgatar a aparelhagem, já que ela continua viva na cultura paraense, e sim, reunir sua história e fazer uma homenagem às pessoas que deram início a essa jornada musical. “Queremos destacar que os sonoros foram o meio pelo qual a lambada, o brega, todos esses gêneros puderam circular pelo Pará. Se os sonoros não existissem, também não existiriam esses ritmos aqui até hoje, as gravadoras não se interessariam em gravar, pois estariam fora de consumo”, explica Darien.

O grupo também procura mostrar o aspecto social e econômico dessa história. Segundo Darien, “muita gente vivia disso, o Milton Almeida, pai do Júnior, sempre trabalhou artesanalmente construindo as aparelhagens à mão”. Eles conseguiram para o museu o primeiro “boca de ferro” com luz. “Eles serviam para anunciar as festas, nessa época não tinha nada de faixas e rádios”, conta Júnior. De madrugada, saía uma bicicleta com o alto-falante pelas ruas. “E colocavam o boca de ferro na frente da sede. Quem passava já ficava sabendo o que ia ter ali naquela noite”.

(Diário do Pará)

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